Monday, December 11, 2006

"Como viver junto"

Com esse tema, a 27ª Bienal de São Paulo está chegando ao fim. No link que está nesse texto você pode encontrar tudo sobre aquela que já está sendo considerada uma edição definitiva na trajetória das Bienais de Sampa. Portanto vou deixar o informativo um pouco de lado e simbora pras impressões pessoais da visita feita ontem.

Arte ou jornalismo? O tema é daqueles que, à primeira vista, podem confudir pessoas que estão em crise de relacionamento. "Como viver junto", convenhamos, poderia ser, facinho facinho, o título de um livro de auto-ajuda para casais desesperados.

O fato é que o tema é político. Dou aqui o meu primeiro ponto positivíssimo a esta Bienal. Das algumas que já visitei, essa foi a mais crítica e mais atual. Na minha opinião, quase que uma Bienal jornalística - não à toa, com muita foto-instalação. Realidade social, convivência em espaços partilhados, saldo de conflitos armados, distorções produzidas pela exacerbação do capitalismo, relações fronteiriças, o domínio das trademarks, está tudo lá, e tudo muito amarrado. Destaque para a obra do fotógrafo israelense que retratou as diamétricas distâncias entre as condições de vida dos povos israelense e palestino (não anotei o nome do gajo, desculpem!).

Acervo "da hora" (literalmente). Não li a respeito dos artistas, mas o pouco que sei é animador. Esta é a primeira Bienal que não tem "jabá" de consulado disputando espaço com Picassos da vida. Explico: até 2004, o acervo era composto por chamarizes de público, tipo Picasso, misturados com indicações dos consulados dos países convidados, muitos de qualidade questionável. Este ano, o grupo foi escolhido à dedo pela curadoria, resultando no que há de mais vanguardista e contemporâneo.

Talvez por esse aspecto menos comercial, tive a impressão de ver um público mais iniciado em arte rodando pelas instalações - e não só "turistas" como eu, que se enfiam no meio de instalações esquisitas para tirar uma foto pagando mico. Por outro lado, esse mesmo público é aquele dos "comentários conceituais e viajandões"... bem, nem tudo é perfeito. No quesito vanguarda, destacaria várias obras, mas uma que chamou muito a atenção é uma escultura feita em açúcar - isso mesmo - mostrando prédios e monumentos de diferentes países feitos sem referência de escala (não anotei o nome do gajo, desculpem!).

Cem video-instalações e uma confissão.
Como sempre, muitas, muitas vídeo-instalações. E uma descoberta pessoal: uma das coisas que mais me desanimam nas Bienais são... vídeo-instalações. Obras de arte que se deixam descobrir logo de cara, tudo bem, não devem lá ser obras com grande valor artístico. Mas que estranho poder é esse, dos vídeos, de se tornarem tão enigmáticos a ponto de pedirem leituras prévias sobre a... biografia de seus autores? Pois colocar um vídeo de um cara andando de bicicleta e dizer que aquilo é uma crítica à sociedade vai além - muito além - do que pessoas não iniciadas e iluminadas alcançam. O mesmo com o vídeo que mostrava, durante uma hora, um barco velho atracado numa praia do Nordeste.

Enfim...depois de quatro ou cinco desses, eu já entrava com aquela dúvida politicamente incorreta: "será que aqui vai ter alguma coisa que preste?". Mas nem tudo está perdido, é claro: gostei muito do singelo, bem-humorado e completamente non-sense: Colibri induzido a sono profundo. (não anotei o nome do gajo, desculpem!)

Samba, narguille e maracas.
Muitas técnicas, estilos, linguagens, cores, raças e times. Gente de muitos países. América Latina, África e Oriente Médio bem representados. Gostei muito de ver que essa Bienal saiu um pouco do eixo Brasil-Europa-Estados Unidos e está olhando mais para o mundo ao redor. Afinal, o mundo fora do eixo Europa-EUA é que está sofrendo muito mais com conflitos armados, pobreza extrema e falta de esperança, certo?!

Destaques para a série de fotos sobre os hutus africanos, as instalações de artistas do Oriente Médio, como a da kuwaitana Abdullah Salem, e para a obra crítica ao estereotipo do carro Opala como veículo ligado à repressão militar e à criminalidade (não anotei o nome dos gajos, desculpem!).

Bienal e criança: nada a ver.
Acho lindo, mesmo, quando vejo aqueles pais zelosos da cultura de seus filhotes explicando as obras para seus rebentos. A arte não é nada mais que um jeito diferente de fazê-los entender o mundo e exercitar a sensibilidade que certamente precisarão no futuro, seja como suporte emocional ou como manual de instruções para um planeta cheio de zonas obscuras. Mas confesso que, se eu fosse a Nina, faria até pior do que ela fez nessa Bienal. Afinal, como explicar para a pequena porque o genial Hélio Oiticica (HO) passava horas se enroscando em seus Parangolés? Nenhum ser humano de 5 anos merece passar por isso com 5 anos. Quem sabem daqui mais uns 5 anos? Isso se ela não passar a odiar museus, tamanho o trauma causado ontem (rs).

Brincadeiras à parte, se você decidir ir com criança, fica a dica: se aparecer um HO na sua frente, explique que o cara faz aquilo porque é doido. Assim, beeem politicamente correto. E corra para a instalação "altamente micável e fotografável" mais próxima.

Em um próximo post, colarei algumas fotos dos micos pagos por nós em duas ou três instalações - e mais impressões, se der na telha.

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